Falha geológica que já causou um trágico terremoto em 1906, ameaça toda a região da Baía de São Francisco há anos. Veja como o pessoal de lá lida com isso!
Você já deve ter assistido ao filme San Andreas, de 2015, onde Dwayne Johnson faz milagres para salvar sua filha e sua esposa de um terremoto de magnitude nunca antes vistas. Veja abaixo algumas imagens do que Hollywood acredita que será o "The Big One", como é chamado o próximo grande terremoto esperado na região:
Como se vê, as imagens do filme mostram uma destruição total de diversas cidades da Califórnia, com destaque para Los Angeles e São Francisco.
Mas esse terremoto pode mesmo acontecer? Estaria Hollywood exagerando?
Veja abaixo o tremor que deu origem à criação desse filme.
O terremoto de 1906
Em 1906, a região de São Francisco foi atingida por um grande terremoto causado pela falha de San Andreas.
As informações ainda são imprecisas, pois na época nem mesmo a escala Richter existia e ainda não há consenso sobre o local exato do epicentro, sendo que atualmente o local mais aceito é o alto mar a partir de São Francisco ou perto da cidade de San Juan Bautista.
O que se sabe e que eram 5:12 da manhã do dia 18 de abril de 1906, quando um terremoto de magnitude estimada em 7,9 a 8,3 graus na escala Richter sacudiu desde o norte da Califórnia o sul da Baía de São Francisco e foi sentido em um raio de 476 quilômetros, até os estados do Oregon e Nevada.
Logo depois dos tremores, vieram os incêndios. Diversos prédios e casas começaram a pegar fogo e a quantidade era tão grande que foram necessários quatro dias e quatro noites para que fossem controlados. Foram 25.000 edifícios incendiados em 490 quarteirões da cidade.
O resultado foi o maior desastre natural da história da Califórnia e um dos maiores dos Estados Unidos, com mais de 3.000 mortos. A maior parte das vítimas estavam em São Francisco, mas houve mortes em várias cidades, como Santa Rosa e San Jose.
Veja abaixo algumas imagens de como ficou São Francisco após o terremoto de 1906.
É possível ver que 80% da cidade de São Francisco foi destruída. A população na época era de 410 mil moradores, sendo que 300 mil ficaram desabrigados. Os parques e praias da cidade se tornaram abrigos de refugiados, repletos de tendas improvisadas, que mais de dois anos depois do terremoto ainda estavam em operação.
As perdas de propriedade do desastre foram estimadas em mais de $ 400 milhões em 1906 dólares. Isso equivale a $ 11,2 bilhões em 2019.
O jornalista Jack London foi testemunha ocular da tragédia e escreveu um impressionante e agora clássico relato sobre ela. “Todas as engenhocas e salvaguardas humanas foram desmanteladas por 30 segundos de contorção da crosta terrestre”, escreveu London. “São Francisco desapareceu. Não ficou nada além da lembrança.”
Entenda a Falha de San Andreas
A Falha de San Andreas é uma falha geológica de mais de 1.200 quilômetros de extensão onde ocorre o encontro de placas tectônicas que se movem e se transformam constantemente. A Placa do Pacífico, que se move para o noroeste, e a Placa Norte-americana, que desliza para o sudeste.
A cada ano, a Placa do Pacífico desloca-se horizontalmente cerca de 5 centímetros em relação à Placa Norte-americana e o grande problema é que a energia do deslocamento dos blocos costuma ser liberada em violentos tremores de terra, sendo que a maioria deles ocorre nas fendas entre as duas placas, as chamadas falhas geológicas. A principal é a Falha de San Andreas.
A falha cruza boa parte da Califórnia e se divide em segmentos norte, central e sul. Em alguns trechos está em terras continentais, em outros passa pelo mar.
O segmento norte da falha começa na cidade de Hollister e atravessa as montanhas de Santa Cruz, a península de San Francisco, as cidades de Daly City, Marin, Bodega Bay, Fort Ross, terminando na junção tripla de Mendocino.
O segmento central da falha de San Andreas corre na direção noroeste de Parkfield para Hollister.
Por fim, o segmento sul (também conhecido como o segmento de Mojave ) começa perto de Bombay Beach, passa pelas montanhas de San Bernardino, montanhas de San Gabriel, Palmdale, a cidade de Elizabeth Lake e se estende até o mar Salton. No seu ponto mais próximo, esta falha passa a cerca de 56 quilômetros a nordeste de Los Angeles.
Sequência de terremotos na região
Os terremotos na Califórnia não deveriam ser notícia. Esta região do mundo registra cerca de 10.000 tremores por ano, a maioria imperceptíveis.
Em relação aos grandes terremotos, o de 1906 não foi o primeiro a atingir a região. Em 21 de outubro de 1868 a Baía de São Francisco já havia sido abalada por um terremoto de magnitude de 6 a 6,7 aproximadamente, causando muita destruição, diversas mortes e uma ruptura no solo de mais de 32 quilômetros, de San Leandro (terra da Silicon Valley Robotic Services) a Fremont (terra da Tesla).
Mais recentemente, em 1989, um outro terremoto de grandes proporções atingiu a Baía de São Francisco. Conhecido como o Terremoto de Loma Pietra, atingiu a magnitude de 7,1 na escala de Richter, causou 63 mortes, deixou 3757 feridos e espalhou danos moderados em diversos lugares da Baía de São Francisco.
A sorte foi que o terremoto ocorreu às 17:04 do dia 17 de outubro, exatamente na hora em que começaria a transmissão nacional ao vivo da World Series, jogo que aconteceria no Candlestick Park em São Francisco, ou seja, o tráfego nas auto-estradas da área da baía era mais leve que o normal. Vários dos principais meios de transporte da região sofreram falhas catastróficas e o colapso de estruturas feitas pelo homem contribuíram para as mortes ocorridas em São Francisco, Los Altos e Santa Cruz, conforme fotos abaixo:
Califórnia ainda espera o Big One (O Grandão)
O que faz cientistas e sismólogos temerem um grande terremoto nos próximos anos é o fato de que as placas tectônicas são interligadas e possuem uma certa periodicidade em seus movimentos.
O fatídico abalo de 1906, primeiro grande desastre natural a ser fotografado pelo homem, não foi o único daquele ano. Quatro meses depois, a cidade de Valparaíso e toda a região central do Chile foram sacudidas por um terremoto de 8.2 graus.
Em relação à periodicidade, os especialistas acreditam que importantes movimentos nas falhas da crosta terrestre ocorrem em ciclos de 100 anos, o que significa dizer que o "The Big One" poderia acontecer a qualquer momento a partir de 2006.
Quando em fevereiro de 2010 um terremoto de 8.8 graus atingiu dois milhões de pessoas no Chile, essa estranha e incômoda coincidência preocupou ainda mais os estudiosos.
Aliás, um estudo publicado em 2006 na revista Nature descobriu que a falha de San Andreas já havia atingido um nível de estresse suficiente para um terremoto de magnitude superior a 7,0 na escala Richter. Este estudo também descobriu que o risco de um grande terremoto pode estar aumentando mais rapidamente do que os cientistas acreditavam anteriormente.
“Pode-se dizer que a falha está grávida de nove meses”, alerta Thomas Jordan, do Centro Sismológico da Califórnia do Sul.
Em 2016, foram registrados mais de 200 abalos em Salton Sea, um lago no extremo sul da Califórnia, no vale de Coachella, perto da fronteira com o México e fica bem no fim da falha de San Andreas. Três tremores ultrapassaram o grau 4 na escala Richter e o escritório de Emergências do governador emitiu um comunicado pedindo a todas as instituições e aos californianos que ficassem em alerta diante da possibilidade de um grande terremoto.
A Prefeitura de San Bernardino, por exemplo, decidiu fechar suas instalações.
Assim como em toda a Califórnia, uma simulação anual de terremotos chamada Great California Shakeout é realizada todo dia 18 de outubro às 10h19 em Los Angeles e simula um terremoto de magnitude 7,8, com uma estimativa de 1.800 mortos e US$ 213 bilhões em perdas. Uma corrida seca na qual mais de 10 milhões de pessoas em todo o estado praticam um "protocolo de sobrevivência a terremotos".
Como o The Big One impactaria o Vale do Silício?
Às 10h18 da manhã de todo dia 18 de outubro, funcionários em todo o Vale do Silício estão se encolhendo sob as mesas e se agarrando à vida. Um lembrete preocupante de que a Terra sob algumas das empresas de tecnologia mais famosas e valiosas do mundo poderia se mover a qualquer momento.
A Bay Area é uma verdadeira miscelânea de linhas de falha complexas. Não menos do que sete falhas diferentes convergem aqui. A conhecida falha de San Andreas é apenas uma das sete "zonas de falha significativas" que o US Geological Survey (USGS) cita na área da baía. Os outros são as falhas de Calaveras, Concord-Green Valley, Greenville, Hayward, Rodgers Creek e San Gregorio.
Alguns geólogos já estão prevendo que o período de 2018 a 2021 será especialmente difícil.
Qualquer coisa acima de 7,9 na linha de San Andreas, que vai de Mendocino ao México, colocaria em risco "aproximadamente 100%" da população de San Francisco, enquanto um terremoto de 6,9 da Falha de Hayward poderia causar problemas para quase todos que vive e trabalha lá, de acordo com a cidade .
Pelo menos 300 edifícios ficam diretamente em cima da falha de Hayward, e outros dois milhões na área da Baía de São Francisco também estariam sob ameaça caso um grande terremoto atingisse a região.
O New York Times estimou recentemente que mais de 100 dos prédios mais altos da cidade (mais de 22 andares) foram construídos em áreas com uma chance "muito alta" de liquefação em um terremoto (liquefação é algo parecido com o movimento da areia movediça).
Cientistas alertam que mais de 22 mil pessoas podem precisarão ser resgatadas de elevadores, enquanto outras 411 mil pessoas podem ficar desabrigadas.
O Departamento de Administração de Emergências de São Francisco sugere ter água suficiente, comida não perecível e pilhas de lanterna à mão para durar cerca de três dias. Porque em San Francisco, você nunca sabe.
Como os moradores do Vale do Silício lidam com esse risco?
Um terremoto catastrófico poderia ter implicações muito além de um impacto imediato no bom funcionamento do Vale do Silício. As empresas de tecnologia sediadas lá, que incluem Facebook, Google e Apple, são uma fonte de imensa riqueza para a economia dos EUA.
O problema, é que as pessoas não estão tão preparadas para isso quanto deveriam, pois o Vale do Silício tem crescido muito em população nos últimos anos. A população da área aumentou muito à medida que as pessoas se movem para seguir seus sonhos de glória e riqueza.
Quando o último terremoto sério atingiu, em 1989, havia cerca de 6 milhões de pessoas na área da baía de São Francisco. Em 2018, estima-se que a população da região tenha crescido para 7,7 milhões.
Além disso, em 1989 ainda não existia a internet e a Apple e a Cisco eram um das poucas grandes empresas de tecnologia da região. Porém, se analisarmos as famosas empresas do Vale do Silício de hoje, quase todas surgiram desde então.
Talvez por isso sejam as poucas empresas que divulgam seus planos de emergência para casos de terremotos.
A Cisco, empresa de eletrônica e computação, é uma das mais antigas gigantes da tecnologia do Vale do Silício. Sediada em San Jose, a Cisco mantém vários contêineres com suprimentos médicos e sanitários, roupas de cama e alimentos para permitir que os funcionários possam ficar no local em caso de desastre. Há também uma equipe de voluntários treinados para liderar a resposta imediata, geradores de backup para fornecer eletricidade em caso de apagão e uma equipe de operações de tecnologia que pode ajudar a restaurar as comunicações danificadas na região.
A Cisco também tem planos de contingência com fornecedores para que pudesse obter grandes quantidades de itens necessários, como água potável, se necessário.
Já a Apple pensou nesse risco ao construir o edifício circular que abriga a nova sede da empresa no Vale do Silício e é tão grande que é difícil entender que não está realmente preso ao chão.
A espaçonave, como o prédio costuma ser chamado, é um exemplo gigantesco de uma tecnologia que reduz os efeitos de um terremoto em até 80%.
Dois andares abaixo da terra, sob escritórios onde os engenheiros projetam iPhones e MacBooks, o prédio fica sobre 692 enormes discos de aço inoxidável. Quando o solo treme, o edifício pode se deslocar em até 1,20 metro em qualquer direção nos discos.
Jobs se inspirou na engenharia japonesa, incluindo a maneira como os prédios foram projetados no Japão para evitar danos ao terremoto.
No entanto, mesmo que todas as empresas no Vale do Silício tivessem edifícios tão robustos quanto os da Apple, isso não tornaria a região à prova de terremotos. Estradas, trânsito de massa, eletricidade, água e sistemas de telecomunicações, sem mencionar as casas dos funcionários, provavelmente serão danificados por um grande terremoto.
Mesmo assim, como falamos anteriormente, a cada ano que passa mais e mais pessoas se mudam para o Vale do Silício em uma nova "corrida do ouro", em busca de sucesso e riqueza.
Isso demonstra que a região é formada por pessoas de coragem. Não apenas coragem para se arriscar no empreendedorismo, mas também coragem para colocar sua própria vida em risco para realizar seus sonhos.
É por isso que o Vale do Silício é o que é. Não se trata do lugar geográfico, mas sim da mentalidade arrojada das pessoas que lá residem.
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